segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

c'était dimanche

Tenho a certeza de que há uma vaga ideia de felicidade que preside ao facto de deixar as camas a arejar numa manhã de sol.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Carta num repente: da memória

Podes ir. Vai. Quando fores, passarei uma esponja sobre tudo. Felizmente para nós, para ti, para mim, a memória é brumosa, como diz o hino nacional. Se até o hino consegue colar tal princípio a toda uma nação, limito-me a fazer o que é suposto: a deixar que as brumas da memória tomem o seu lugar.
Desejo que ninguém te conheça, não quero que reste sequer um esboço das tuas feições, um eco vago do teu nome. Não chegarei ao extremo de desejar que sejas uma versão humana do hotel Stella Maris para que com o desaparecimento de todos os que te conheceram desapareça a memória da tua existência. Isso não.
Mas que passe um dia, uma semana, um mês, uma estação. Para que a cadeira onde te sentaste deixe de ser a cadeira onde te sentaste para ser apenas uma cadeira onde entretanto tantas outras pessoas se sentaram. Para que o teu casaco deixe de ser o teu casaco e seja somente um casaco feito e vendido em série. Tão simples quanto isto.
Que até o meu tacto se esqueça, o toque algo mole e excitante da tua cintura.

Oh, escuta: passa uma canção nova na rádio. Já nem sei quem tu és.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

hommage discret

Gostava de poder saber - e tenho pena de não poder saber - o que seria passear numa marginal junto ao Índico.
Os meus polegares continuam desfeitos e não há perspectivas de melhora.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Tomás revivendo

Tomás conhecia aquela história, fora Tomás que a escrevera. Sabia o que se iria passar, o que iria sentir, o que iria dizer (à amiga). Pensou no quão oportuno lhe parecia regressar à casa da Praia das Maçãs, a da sala cheia de fotografias, a do jardim de muros brancos.
Isto para escrever alguma coisa. Tenho as unhas dos polegares roídas por inteiro.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

O quarto branco

O quarto era branco e bonito de tão simples, nem sei como o deixavam assim para um convidado. O cheiro adocicado e áspero da colcha enchia a divisão. A janelinha dava para o alpendre e via-se lá em baixo o rectângulo faiscante da piscina. Em volta só a terra e as árvores.
Tinha sido naquele quarto que uma das mulheres da família trouxera ao mundo uma das outras, algumas décadas antes. Será que o aroma que a recém-nascida sentiu era já aquele misto de madeira e sabão?
Da janela alguém gritou para avisar Branca que andava pela horta, décadas antes de existir naquele local a piscina. Branca era a criadita que um dia morreria de amor por um rapaz de quinta não muito distante. Por razões um tanto ou quanto obscuras um dia fizera-se ao caminho para ser encontrada morta na planície, que nem Mireille. Uma história fascinante e sórdida o suficiente.
E o local que a criada pisara tinha agora uma piscina azul.
Mas no dia do nascimento a rapariga não sabia ainda que estava para ser uma versão alentejana da provençal. A mim deliciava-me o cheiro do quarto.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Lisboa-Cascais

Apetece-me fazer outra coisa.


"Fior di giagiolo..."
(Lola na ópera Cavalleria Rusticana)

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Pequeno apontamento

O jardim. Tão quente naquela noite de Estio. (Em toda a cidade um calor terrível se desprendia do chão e das paredes.) Havia uma melodia que saía pelas janelas iluminadas.
E ela andava por ali, pelo jardim de vegetação densa. Poderia dizer-se que os arbustos e as árvores descansavam do verde diurno, como alguém mais tarde escreveu.
Mas ela. Abrindo-se às plantas do jardim, depois da amiga que a acompanhava ter ido para dentro. Se fosse soprano em palco, seria um lamento sublime aquele que sairia das suas cordas vocais. Oh, tão sublime.
Cantado sobre um fandango espanhol em surdina que alguém tocava naquele momento ao piano.

domingo, 18 de outubro de 2009

O baile do governador IV

Por isso até agora concordámos já nas insondáveis vontades e motivações desse belo tenente que um dia trouxe novo brilho a esta cidade de província. Recorda-se a minha amiga da sua primeira aparição oficial? Naquele sarau de gala do Municipal. Exactamente, esse em que o Nunes da flauta atacou por engano o Hino da Carta em vez d'A Portuguesa! Que impressão causou... O tenente, não o Nunes da flauta!
Pois dera ele, com aquele incrível bigode, a prestar-se a idílios com a Rosinha Gonçalves e depois entrar em reclusão. Não, realmente isso não se faz! Vá-se lá compreender os homens, ainda para mais loiros e de ar sensível. Acredito que a minha amiga prefira aqueles que sabem o que querem e pode estar certa de que não é a única.
Mas a surpresa da noite estava para acontecer. Algures entre uma dança e outra, o tenente Zeferino - que todo o serão ali estivera quieto - aproximou-se da filha do Dr. Gonçalves e agarrou-lhe a mão, causando na moça forte impressão. Quem não sentiria, aquela mão tão masculina e delicada agarrando a nossa!
Pois agarrou-a e afastou-se com a jovem. E parece que falaram. Parece que ele finalmente se decidiu e escolheu aquela noite de baile para lhe comunicar a decisão: queria ficar com ela.
Não era um desenlace tão feliz? Claro que era...
Mas tivesse ele sido mais homem e menos filósofo e teria estado mais tempo com ela. Eu gosto muito dela, mas não consigo deixar de sentir algum regojizo por ele ter sido no dia seguinte destacado para a guerra.

O baile do governador III

Compreendo porque a cativa tanto a imagem do tenente sonhando antes da chegada do crepúsculo e fico feliz por se sentir cativada. É uma imagem bonita e se carregar bem no brilho do laranja, quase que se consegue imaginar naquelas salas de escassa mobília com ele.
Demoro-me demasiado nessa cena inegavelmente bela? Creio que não falo apenas por mim se disser que na noite do baile do governador dava vontade de ficar parada a adivinhar-lhe o desenho do corpo sob o uniforme e os galões. Exagero?! Vou parar então, sua púdica! Mas com aquele corpo, benza-o Deus.
Avancemos para o cerne da questão: a Rosa. Agora até rio a pensar que todas estas fantasias cor-de-laranja não foram mais do que uma nota introdutória que se prolongou.
Sim, a Rosa, a filha do Dr. Gonçalo Gonçalves. Ela e o tenente Zeferino Serrano estavam apaixonados. Apaixonadíssimos, diria mesmo. Um amor jovem que nasceu de esporádicos contactos.
Não reparou como na noite do baile entrou no salão tão simpática e arrastada? Pois pudera, coitada! É que ele, o tenente, muito apaixonado, mas também muito de meditações, de repente toca de se achar confuso e de se afastar. Percebe agora porque lhe falei daquela imagem que tanto a cativou? Praticamente sem dizer nada, deixou de falar à rapariga e é provável que se tenha fechado na suas salas viradas a poente.
E ela tão tristinha no baile, ali vestida de rosa, a vê-lo na mesma sala. E ele que lhe evitava o olhar, o estúpido.

O baile do governador II

Estou eu a dizer-lhe, o tenente Zeferino era uma pessoa complicada. E não sou a única a achar isso. Vá lá, até o outro tenente - não me lembro do nome - o dizia.
Que era muito bem-parecido, uma lufada de ar fresco nesta cidade, lá isso era. E naquela noite do baile do governador civil... Um verdadeiro príncipe em uniforme de gala. Não me vai dizer que também não achou isso, aqueles cabelos tão apetitosos que pareciam trigo?
Mas também tinha as suas manias, garanto-lhe.
No quartel tinha ao seu dispor duas salas... E ficava horas lá fechado. A pensar, a pensar. Parece que gostava de ficar a ver o pôr-do-sol da janela, quando ficava tudo tão laranja à maneira de uma explosão de tépida felicidade. Sim, depois do quartel começa a planície, pode calcular como era largo e laranja o cenário, tanto o que a vista dele podia observar enquanto pensava. Em quê não sei ao certo. Mas ele era tão bonito, que quase nem importa. Imagine-o só, ali muito parado, muito sério, com aquele olhar muito azul e aquele bigode muito loiro. E tente só retratá-lo nessas meditações alaranjadas envergando aquele uniforme tão luzidio da noite do baile.
Pois, não é preciso dizer mais nada.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

O baile do governador

E como luziam nessa noite os galões do tenente Zeferino Serrano...

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Louise em Toulouse

Quando estava em Toulouse, Louise ouviu nos salões à respeitável mulher de um magistrado uma história, uma que pelos pormenores sórdidos especialmente a fascinava.

A futura mulher de Jean não relatará certamente a história desta maneira. Primeiro, porque não foi assim que a ouviu à respeitável mulher de um magistrado deliciada em descrever com minúcia e vagar o momento em que Marc, o louco, proferia (gravemente, dizia ela) o nome de Nicolas, Nicolas se virava e Marc disparava. Mostrava igualmente especial apreço pela figura de “uma pobre rapariga” (Magali) a surgir romanticamente por detrás de um plátano.
Segundo, assinale-se que Magali surge como figurante, mera espectadora, nesta história, no irreal momento do disparo. Se Marc na sua demência nunca tivesse feito as opções que fez, a presença de Magali na praça àquela hora seria de todos desconhecida. A sua presença e as razões da sua presença.
Daí termos escolhido dar algum espaço a Magali, pois é uma injustiça como às vezes se privilegia apenas um dos pontos de vista. E a nobreza dos sentimentos da jovem de Carcassone seria tão ou mais digna de nota que a loucura do primo de Jeanne.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Rosas num copo

As rosas meio murchas num copo de vidro dando à mesa um ar de hotel levemente decadente.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

J

Não sei ao certo porquê, mas imaginei que se suicidava. Seria tão brutal, tão lógico. Depois da consternação inicial, não poderia evitar um sorriso. Tão lógico.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

De novo o Square Gambetta, Marc e Nicolas

Ainda bem que o nome de Nicolas não inclui a letra R, letra que um problema de dicção não permite Marc pronunciar correctamente. O momento iniciado com a articulação do nome teria perdido toda a solenidade.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Square Gambetta

São três horas da tarde, ouvem-se as badaladas vindas de um campanário. O sol cobre toda a cidade, sopra persistente o vento tramontano.
Magali está encostada a um dos plátanos do square Gambetta, aquele extenso pedaço de terra amarela que cobre quase toda a praça. Duas filas de plátanos alinham-se de cada lado do terreno, deixando toda aquela vastidão amarela sujeita ao tramontano. Ali mesmo, no meio da cidade.
E Magali (vestida de branco, o branco revolvendo-se em volta dela) encostada ao plátano, olhando sem ver. Saíra de casa num assomo de desespero. Por isso olhava sem ver, tentando controlar as lágrimas.
Na praça deserta entrara Nicolas, que às três badaladas cruzava o square Gambetta na diagonal. Caminhava indiferente ao vento, sem pressa. Magali, oculta na silhueta do plátano, não o via. Magali tão triste pelo que tinha sido e deixara de ser, pelo menos para ela.
Nicolas atravessava a poeira do square, cheio daquela felicidade que só se alcança nos primeiros momentos de uma história que ainda tem tudo para dar. É que Nicolas, após delicadas etapas, tinha enfim tido o acordo dos sentimentos de Jeanne. E era nela que pensava agora, era para ela que decidira deslocar-se até ao castelo para lhe comprar rebuçados coloridos. Algumas palavras podem chegar para descrever o estado de espírito de Nicolas, mas qualquer descrição seria incompleta.
Magali continuava encostada ao plátano, o vestido branco à mercê do tramontano, ela própria à mercê de uma tristeza que lhe parecia imensa. Lembrava-se de Jean-Baptiste e do que ele lhe dizia, da doçura das horas. Lembrava-se, não se queria lembrar, mas queria lembrar-se, revendo momentos, gestos, rescutando palavras. Palavras ainda tão presentes, tão encantadoras. Palavras que agora Jean-Baptiste diria a Amélie, também ela encantada. Um elogio bem elaborado ao brilho dos olhos, à maneira de inclinar o pescoço, talvez.
Palavras que também Nicolas poderia murmurar a Jeanne, por exemplo quando a presenteasse com os rebuçados coloridos comprados no castelo.
Era por isso que Nicolas cruzava o square, obliquamente às filas de plátanos. Era por isso que Magali permanecia encostada ao plátano, alheia.
Faltava surgir a terceira figura daquela tarde: Marc. Marc é primo de Jeanne, tem problemas psíquicos, tem uma paixão por Jeanne. Marc avança pelo square, também ele na diagonal. Marc apressado. Marc tem uma arma de fogo na mão. Marc aproxima-se de Nicolas e chama-o. Nicolas vira-se, vê o primo de Jeanne e cai com um tiro no peito.
O tiro ecoou na praça deserta, veio uma rajada forte do tramontano. Magali demorou a reagir, só aí contornou o plátano para ver Nicolas a viver os seus últimos instantes, sangue ensopando a poeira amarela. Marc afasta-se a correr.
Passava muito pouco das três da tarde no square Gambetta, em Carcassone.

recortes de Aix-en-Provence

Encontrei-me com a Miss Mars em plena cours Mirabeau, em Aix-en-Provence. Estava calor e tomámos café.

sábado, 18 de julho de 2009

L'amant II

Riu-se para si próprio, pelo que a situação tinha de irreal. Se calhar era a luz emanada dos abat-jour amarelos que tornava tudo tão irreal, onírico.
Consumia com os olhos todos os traços físicos e o que com eles fazia.
Encostado ao ombro do outro deitava-se à fantasia, imaginando que não era naquele hotel de janelas chuvosas que estavam.

terça-feira, 14 de julho de 2009

L'amant

Uma manhã de chuva, daquelas que entram tristes pela janela. O céu a oscilar entre o cinzento e o lilás. A luz que entrava fraca e fria, que quase nem parece luz, daquelas que enchem a manhã de tristeza e fazem apetecer mais o calor da cama.
Despertava. Ouviu o som da água a correr no compartimento contíguo e enrolou-se nos lençóis em busca dessa tepidez da cama. O som da água a correr que era tão triste, assim como a alcatifa castanha do chão, o papel de parede amarelado, a mobília escura de traços simples e a manhã que entrava pela janela (o outro tinha aberto as cortinas um pouco).
Por momentos só conseguia pensar na tristeza de tudo, na escuridão da manhã e em como tudo aquilo o deixava tão lasso. E a água que corria.
Pensou na pertinência dos acontecimentos, na sucessão das coisas. Porque tinha o início tanto calor e tanta febre. Porque tinha o fim a tristeza de uma manhã de Outubro em que as rodas dos veículos espalhavam com ruído a água das poças. Bem, pelo menos até ao próximo início, que na melhor das hipóteses seria na noite seguinte.
Era assim que tinham planeado.
(Mas a tristeza da brevidade permanecia - pelo menos para ele que ali estava estendido na cama - presente nos sons da água que corria, nos gestos de apertar o cinto ou arrumar os óculos na cara.)

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Notas para Diocleciano

Reconheci-lhe logo uma propensão para o exagero. Talvez um pouco como Diocleciano. Que vestia calções de banho de cores garridas e gostava de dar as suas tiradas sarcásticas.
Naquele dia os calções eram verdes, verde-relva, e Diocleciano enterrava os pés na areia para se surpreender em seguida com a beleza das suas formas, num acesso de narcisismo.
Diocleciano que, no seu à-vontade e despreocupação (mas tão adorável, tão inocente), se deixara surpreender pela instabilidade emocional. Por um interior a revolver-se em questões e vontades. Que nem uma Tatyana.
Deitado sobre a toalha, os olhos fechados e o sol aquecendo-o. Todo aquele quadro de placidez e calor que não deixava adivinhar o turvo interior.
No final do dia, Diocleciano estava morto. Ainda não sei bem como.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

crónicas

Das coisas mais acertadas que tenho dito ultimamente:
"Vou só tentar não ficar muito crazy about it."

quinta-feira, 2 de julho de 2009

chante avec moi

Já passou quase um mês, mas quero deixar transcritas as sensações daquele final de noite. Não terminou com uma imagem de harmonia como a de "Helena a ser depositada no relvado de uma vivenda", mas com um sensação de calma, feliz placidez... de dever cumprido e a possibilidade de algum descanso após umas boas gargalhadas.


"Pour te séduire, je veux sourire, je veux chanter."
(Dinorah na ópera Dinorah, acto II)

quarta-feira, 1 de julho de 2009

não quero dar nome a este.

E antes de me vir embora... As meninas de lágrimas nos olhos. César Malaca a dizer-me coisas bonitas. Lá estava eu armado em tough guy. Mas devia ter retribuído palavras tão elogiosas. Porque ser Chevalier é também ficar muito sensibilizado, ainda que a atrapalhação inicial não ajude às reacções. Para que conste.
Gosto de ser surpreendido desta maneira.


"Voyons, Manon, plus de chimères..."
(Manon na ópera Manon, acto I)

segunda-feira, 29 de junho de 2009

sonhos

Um dia destes sonhei que a rua do colégio tinha mudado de nome. Não gostei, deixou-me desconfortável.


(Como podem ver, não vos abandonei. Tenho muitas coisas que gostaria de registar, vou tentar recuperar.)

segunda-feira, 8 de junho de 2009

desejos.

Vinho branco. Apetece-me vinho branco.

domingo, 7 de junho de 2009

tempos de crise, tempos de tudo.

Cansaço. Apenas isso. E tanta coisa pelo meio.
Os la la la deliciosos do Sr. Poulenc. Não, a sério, são mesmo. E a preguiça, tanta.
Reencontramos certas sensações por causa de meia dúzia de palavras cúmplices e banais, que nos deixam num estado de não-sei-quê e, pior, de não-sei-porquê. Ou sei, ou sabemos. (Derreto-me com facilidade.) É possível não pensar em nada?
Basta-me o Sr. Poulenc, a sério. É a coisa mais simpática dos dias recentes. Isso e a voz da Beatriz Batarda.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

ensaios.

Sim, chego a encontrar algum conforto na aparente empatia.
Talvez pudesse encontrar todo o conforto.


"Elles n'ont pas, vos enchanteresses,
les effrois charmants des premiers aveux."
(Ellen na ópera Lakmé, acto I)

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Quartos de hotel

Quartos de hotel. Quem não gosta de quartos de hotel? São impessoais. E, se pagarmos a quantia suficiente, confortáveis, fofos, amenos. São também cliché e cliché ainda maior é chegar sozinho e conhecer outros hóspedes. Mas que fazer do cliché quando há pessoas que se prestam a isso? Foi assim que ele chegou, todo ele cliché, sozinho a um quarto de hotel. Foi assim que conheceu outros hóspedes.
César, que de César não tinha nada, mas que era bem apessoado. Ar comedido, agradável, talvez expectante. O quarto dele era perto dos dos outros. Os outros. Cruzaram-se no corredor, um corredor tão amarelado, luminoso e tépido que era quase irreal. Viram-se depois à beira da piscina, essa piscina perfeitamente rectangular rodeada de relvados e à beira da qual todos se estiravam de maneira muito rígida e estudada. Cruzaram-se novamente no corredor. Na noite do segundo dia, Simoneta, toda senhora, toda desempenada, convidou-o a jantar com eles. Eles.
Para além de Simoneta, toda senhora, toda desempenada, toda conversadora, havia Miguel, Jorge, Margarida e Gaspar.
Miguel era o quase marido de Simoneta, todo muito senhor e muito visível nas suas roupas demasiado claras. Dava gritinhos e gostava de ser o possuidor orgulhoso de Simoneta. Imaginem afectos ostensivos. Jorge era o seu companheiro de todas as horas. Os dois muito galhofeiros, muito ridentes, quase alarves. Uma alarvia que cheirava a perfumes caros e vestia roupas (ainda que por vezes de gosto duvidoso) de boa qualidade. Já foram mencionados os suspensórios e coletes ridículos de Jorge?
Depois, Margarida, a namorada calada e perfeita de Jorge, a mais recente aquisição do grupo. Era bonita e gostava/gostara de Jorge. Não se sabe ao certo em que pensa ela, sobretudo quando está com os restantes, dado que ninguém está muito interessado em saber.
Gaspar não sabe muito bem porque está naquele hotel com os outros. Gosta de dares de distante, sempre com o seu livro, um pouco afastado dos restantes, ora muito observador, ora muito (aparentemente) desatento. Gosta de dar ares de extravagância diletante, de intelectual que está mal com o mundano, apesar de viver dele impregnado. Gosta de rir. Quando fala, gosta de fazer comentários cortantes, como se desdenhasse tudo. Um bocado peneirento.
Foi com estes cinco que César se sentou à mesa na noite do segundo dia.

sábado, 9 de maio de 2009

Bristol Club

Pequena colaboração do nosso Chevalier no Bristol Club 1927. Entrada de 8 de Maio.
Enjoy.

Makis

Fecha-se a porta. Descem-se as escadas. Bate-se à porta.
- E se fossemos jantar ao japonês?
- Boa!
- E se chamássemos o Zé?

Sinto falta destas coisas.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Do pão

Gosto de pão de sabor neutro, simples, que não agrida as minhas papilas gustativas. Não gosto daquele pão com sabor forte. Acho sempre que o próprio pão tem personalidade forte.

E gosto de grandes copos de esferovite. Porque são confortáveis e impessoais.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Novas companhias

Prova de que a minha vida anda mesmo excitante ultimamente: estou a ter um caso com o João Belo. Que morreu em 1928.

Exacto.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Morceau da casa da praia

Catarina Ofélia deixava-se ficar estendida, enquanto Sebastião lhe falava na sala. A luz que entrava pelas janelas, o cheiro da praia por todo o lado. Estou a vê-los, ela encostada a ele, olhando não sei bem o quê. Ele a falar, a falar. Ao longe... o ruído do mar. Sebastião gostaria de saber em que pensava ela. Fascinava-o, frustrava-o. Por isso lhe falava: por não saber controlar o fascínio, por querer ultrapassar a frustração. Ouve-se a voz de Sebastião que lhe fala, que lhe fala.
E ela, muito quieta, muito calada, os olhos abertos. Feita visionária.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

25 de Abril em retalhos

Na manhã do dia 25 de Abril de 1974, a minha mãe acordou, fez o que fazia todos os dias, saiu de casa. Ao chegar ao liceu, foi-lhe dito que voltasse para casa.
Os colegas, os da turma A, vieram a desaparecer. Tinham fugido para o Brasil.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

escrever, escrever

Gostava de escrever um texto. Um texto onde juntasse vários elementos, as várias coisas que vou vendo, ouvindo e pensando. Vejo-as, ouço-as, penso-as e quero registá-las.
O Carlitos que, em toda a sua chico-espertice, aparece no final de conferências a que não foi para meter os dedos aos bolinhos do pseudo-catering (e a Clarinha Guimarães a dizer que os cabelitos espetados no alto da cabeça lhe dão "muita graça"). A Menina L. que é tão simpática, ainda que não pareça. A professora a dizer "podes aproveitar que ele está a tocar a escala de sol maior".
Estou agora a imaginar uma conversa entre estas personagens e a imaginar o nosso Carlitos ser alvo de um franzir de sobrancelha geral. Sobretudo se falasse no preço das bolachas.
As Avenidas Novas são um bom sítio para um cair de noite a prenunciar o Estio.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Post incompleto

E o jantar? E o jantar? Os intelectos em alta e o cair da noite tão agradável.

domingo, 19 de abril de 2009

Jornal diário

Olhou para o jornal e leu a data. A data lembrou-lhe a mãe, que faria anos nesse dia (se fosse viva). Lembrou-se depois que o aniversário da irmã tinha sido no dia anterior. Ligou-lhe então.
Não foi o único. Também outros deram os parabéns à filha no dia da mãe.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

La vérité sur les colonies

Não quero que esteja um sol apetecível enquanto eu tenho de estar a ler coisas (lá dentro) sobre o Portugal ultramarino dos séculos XVI e XX. Não quero.
Ouçamos o segundo acto da Lakmé para nos inspirarmos.
As persianas descem às 17h, com aquele ruidinho.

"C'est Mrs. Bentson, qu'avez-vous ?"
(Rose e Frédéric na ópera Lakmé, acto II)

João e Luísa

(Baseado em factos verídicos)

Luísa ali está. Não fica indiferente ao olhar de João que a fixa. João que tem um rosto agradável, apesar do nariz um pouco à koala, que tem pêlos de barba escura semeada pelas faces brancas. Acima de tudo, João que tem olhos azuis, de um azul gélido. Olhos que fixam. E Luísa ali, a sentir-se olhada. E a gostar.

Sabe que apesar de um pouco perturbador, gosta. Mesmo que ele não lhe fale, apenas a olhe, a fixe. Não dizem que falamos pelo olhar? Talvez melhor que pelas palavras?
Vários pensamentos que lhe passam pela cabeça, agora que dá por si a gostar do olhar azul que João lhe deita com alguma insistência. A gostar desse olhar e a admiti-lo para si própria.
Pensamentos bonitos. Quem não gosta de os ter? Pensamentos azuis que metem um sorriso (onde cabem todos os adjectivos que signifiquem algo de bom, algo de muito bom) rodeado de pêlos de barba escura. Não basta um olhar para nos perdermos? Isto pensa Luísa naquela sala em festa, onde não muito longe dela está João de olhos azuis. Azul-que-faz-Luísa-sonhar.
E aproxima-se Gustavo. Gustavo. Ao aproximar-se Gustavo, Luísa lembra-se porque nunca aquele olhar azul poderia ser mais do que um olhar. Pelo menos para ela.

Soubera bem a ilusão, tem de admiti-lo.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

11 Lisboa

Sento ou não sento? Porquê? Penso numa série de hipóteses enquanto olhava as árvores e o alcatrão. Estava sol.
E depois, nova interrogação. "Bem, até logo!" Queria deixar-me ficar para trás. Para falar, perguntar qualquer coisa. Teria por onde começar. E mesmo que não soubesse o que dizer, diria. Apetecia-me dizer.
Algo que não fosse "bem, até logo".

quarta-feira, 25 de março de 2009

Acerca da literatura incontornável


- Eu não acabei esse livro.
- Eu acabei... Mas era tão chatinho, não era?

sábado, 14 de março de 2009

este não leva título

Tenho tanta, tanta pena.
Percebi logo pela cara dela que algo se passara. Tinham estado as duas a chorar juntas durante uma hora.

(Abertura da ópera Eugene Onegin)

quarta-feira, 11 de março de 2009

Le soir

Noite agradável, poderia propiciar recordações. Como ultimamente o estado do tempo tem feito. Inícios de calor? Já todos sabemos o que significa.
Mas deixemos isso de parte por agora (para sempre). A noite estava mesmo agradável, quase tépida. A calma interior a fazer-se à calma exterior.
De que falávamos? Algo sem grande conteúdo, teor simples, como a altura do dia o exigia. Pequenas histórias, os factos do dia.
Caminhámos pela rua de vivendas, calma, calma. Não me quero cansar de adjectivos que correspondam àquela sensação.


"C'est lui que j'aime
Et pourtant j'hésite aujourd'hui..."
(Manon na ópera Manon, acto II)

quinta-feira, 5 de março de 2009

car si j'ose vous supplier, en implorant votre clémence

Santa Maria, mãe de Deus, rogai por nós pecadores.

A igreja escura e vazia. A tarde acabada de começar e pareciam ser já cinco horas. Um fiel aqui e ali. As mulheres que rezam lá à frente. Como se chama a oração delas? Novenas? Pelo menos uma tem um véu branco colocado sobre a cabeça.

Rogai por nós pecadores.

A igreja escura e os vitrais tão coloridos. Que representam? Não me preocupo em descobri-lo. Toda uma tristeza, os meus pensamentos em direcções múltiplas.
Em vão tentava a coerência. Saí pouco depois, as mulheres rezando sempre.

Rogai por nós pecadores.
Rogai por nós pecadores.

domingo, 1 de março de 2009

Os inquéritos

- A mulher começou a chorar, fiquei cheia de pena.
- E o que é que fizeste?
- Deu-me imensa vontade de rir.
(E o homem que gritava de dentro "Fecha a porta que ela tá-me a queimar a luz do corredor!")


Acho que estava mesmo a precisar disto.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Rêverie occidentale

Et du coup j'étais dans le train. A ver o mar.

O vapor que se eleva da caneca de café. Crêpes Nutella quase caseiros. "Não gosto de Nutella." Come com banana, pior para ti.
- C'est atroce ! dizia Caroline e eu contentíssimo por ouvir essa expressão de novo. E o Nicolas que me abraçou. Cheguei a perder-me na conversa, mas não me importava. E que disseste tu, Victor? C'était surtout un plaisir? Estava tão imbuído de tudo, tão boulevard Haussmann, que lamentei não te conhecer melhor.
E deu-me a melancolia.
Ficar na cafetaria numa manhã que lá fora estava cinzenta. Ficar à conversa acompanhado de um café crème e de dois croissants. Falar, falar, de tanta coisa. E tudo a saber-me tão bem.
Tive pena de não ter uma flor para deixar na campa de Delibes, de Thomas (e de Adam, se o tivesse procurado). Agora parece parvo, mas naquele ambiente apetecia. Ficamos cheios de respeito e de admiração.
Saint-Lazare. Tudo. Parar na boulangerie para comprar beignets. E macarrons! Vamos provar macarrons!
Um restaurante italiano perfeito. Comida caseira em Bagnolet, num appart muito francês: "está a saber-me mesmo bem". Ficar sentados a apanhar sol e frio. Ou jantar japonês em Edgar Quinet. Ou ver um filme.
E eu triste por sentir falta de tanta coisa. Todas as conversas sobre tanta coisa, sobre coisas que foram. E o risos. E os risos.

- Je prends un café crème et un croissant, s'il vous plaît.
E sentei-me de frente para os vidros, também com um sumo de laranja pressé (nota mental: para a próxima de lata, já que se paga o mesmo, estúpido, não me voltas a enganar) e um autor comunista. Lá fora os aviões e o cinzento.
Et du coup j'étais dans le train. E a perguntar-me porque não fazia isto mais vezes. E a praia tão agradável.

"Aux Galeries La Fayette !
Courrons y faire emplettes !"
(Três raparigas na opereta Pas sur la bouche, acto I)

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

some perfectly beautiful verse

A pedido de várias famílias (miss Laura, diria Sebastianito Guerreiro, já que andamos numa de O Cais das Merendas), algumas palavras.
Vão-me saber tão bem uns dias com as viajadas, uns dias sem obrigações, sem ter de pensar que tenho algo para fazer. Claro que não deixo de ter que fazer, mas isso fica tão longe, que nem me importa, por enquanto. Hoje devo estar redundante, acho que tem vindo a acontecer com alguma frequência. E viva o alojamento (quase-)gratuito!
Quanto ao que se tem passado... Merecia alguma reflexão, algumas palavras bonitas, decerto. It has been a pleasure.

"I met this perfectly marvelous girl
In this perfectly wonderful place"
(Sally no musical Cabaret, acto I)

domingo, 8 de fevereiro de 2009

untitled - intro

Ali estávamos, sentados na areia, enterrando os pés e levantando-os em seguida para ver os grãos (escaldantes à superfície, mais frescos por baixo) esvaírem-se por entre os dedos.
Ali estávamos, naquela perfeição estival, porque perfeito é o adjectivo correcto a aplicar a tal contexto. Parece que nada falha durante as horas que estamos no areal, só nós, o areal, o sol e o mar, tudo o resto deixado de fora, olvidável.
Tudo é calmo e placidamente feliz. Diocleciano dizia que a praia tinha qualquer coisa de beatífico. Todos se riam muito, mas sabíamos ser verdade, ainda que talvez não naquelas palavras.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

j'irai seul

Há dias em que a Biblioteca Nacional de Portugal (née de Lisboa) fica o caos porque o sistema informático assim o decide, numa de "vamos voltar ao antigamente, ao manual".
Há dias em que de manhã falas com uma pessoa em Lisboa e à noite ela está a falar contigo de Rouen. Amanhã, nova partida. E ainda não sabes o que vais fazer das saudades. Beijinho especial para a mais recente habitante de Bagnolet, leitora das mais regulares, e claro, para a Miss Mars.

Um dia de cada vez. Por agora não tenho imaginação para o fazer de outra forma.

"Je me souviens... La ville était en fête..."
(Gérald na ópera Lakmé, acto III)

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Earl grey

Ver a tinta das ervas do chá espalhar-se na água do fervedor. Deve ser a coisa mais bonita que tenho visto ultimamente. Há toda uma calma na simplicidade do acontecimento que me cativa.
Sim, devo andar necessitado de uma certa felicidade "doméstica".
E isto está a ganhar contornos que não me agradam. E estou a falar da escrita.

"Ah, c'est la couronne qu'il m'a donnée.
Elle est tombée en pleurant."
(Mélisande na ópera Pelléas e Mélisande, acto I)

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

en proie à une immense détresse

Ponto final, parágrafo. Está tudo à beira de começar a mudar. Para pior, com perda significativa de companhias quotidianas.
Ainda que certas coisas corram bem. Nem o fim das avaliações tem o mesmo sabor.
Tenho medo de não saber lidar com isto.


"Ô Magali, ma bien-aimée,
Fuyons tous deux sous la ramée..."
(Vincent na ópera Mireille, acto II)

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

C'est en vous que j'ai foi, parlez pour moi

Os bilhetes há muito guardados lá saíram da gaveta.
Por onde começar? Ah sim, detesto assinantes nascidos antes de 1940 que passam os intervalos a cortar na produção moderna mesmo ao meu lado.
Aliás, eu até gostei da interpretação à década de 70 e de alguns aspectos mais "fortes". O Faust a tirar a camisa era dispensável, mas a Marguerite a matar o filho em cena e o regresso de um Wagner completamente mutilado da guerra não eram de todo absurdos.
O acto do jardim deixou-me deveras encantado. O ambiente nocturno de quintal de bloco de apartamentos foi muito bem conseguido e gostei como nesse momento a ópera foi posta a um nível bastante terreno e realista sem perder o charme ou a dignidade, o que me agradou. É possível a Marguerite cantar a balada do rei de Thulé enquanto muda uma planta de vaso.
Acho que a minha opinião quanto a este acto mudou. A música e o intimismo da sucessão perfeita de cenas com poucas personagens convenceram-me. Por outro lado, os coros que abrem e fecham o segundo acto não me arrebataram como eu esperava. Gostei dos momentos de freeze
do primeiro deles.
O Siébel, essa personagem que eu tanto queria conhecer em carne e osso, estava simplesmente adorável com aquele andar desajeitado dentro de um fato largo aos quadrados. A cantora conseguiu dar-lhe toda a inocência de um rapaz apaixonado na canção das flores.
Tive pena de que o cenário que representava uma sala enorme servisse para vários espaços, às vezes dificultava a percepção do local em questão. Cenas como a do regresso dos soldados ou a da igreja estavam geniais, parecendo até na primeira que fazia parte daquilo.
O elenco agradou, sobretudo a limpidez do par romântico. Ainda poderia falar de uma série de coisas, mas o jardim, esse, seduziu-me...

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

cold january

Lá fomos, comer japonês e passear pela Baixa. Há quanto tempo não fazia a Avenida da Liberdade a pé? Fazia tanto frio, sentámo-nos num banco ao sol, em plena avenida. E falar, falar, falar. Tentar dizer tudo o que a distância não permite com frequência. As coisas continuam as mesmas, noutros cenários.
Entretanto, volto a derreter-me ao ouvir "Que son regard est tendre et que j'ai de plaisir à l'entendre..." lançado pela Manon. Lembra-me o sabor do gelado de pêssego todas as tardes daquele Verão. Até que ponto sinto falta?

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Aveiro, 0h01

Nos foguetes toda a inocência e expectativa, por momentos toda a realidade num delicioso stand by.
Depois... que o álcool e a música tomem a palavra. Corramos todas as ruas.
De manhã, o sol brilhava.

"Profitons bien de la jeunesse,
Des jours qu'amène le printemps ;
Aimons, rions, chantons sans cesse,
Nous n'avons encor que vingt ans !"
(Manon na ópera Manon, acto III)