quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Hotel na areia 4

Não se engane. O gesto de estender a mão para a mão húmida, o caminho que fazíamos juntos até ao quarto e o que nele acontecia nalguns daquelas manhãs de praia eram pequenas ilusões, de significado limitado.
É que quando via os calções de banho vermelhos caminhando pela praia e lhes adivinhava o conteúdo, havia uma outra imagem que me vinha à cabeça. E essa eu não conseguia mesmo impedir; a de um outro corpo de pele mais clara e que eu sabia (por ter visto uma vez) que usava uns calções de banho azul-céu.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Hotel na areia 3

Aqueles momentos na praia estavam, apesar de tudo, repletos de um grande erotismo. Pelo menos, eu sentia-os como tal. Talvez apenas eu.
Enquanto eu permanecia meio vestido na toalha, com os olhos postos num livro ou na linha da água, ele entregava-se aos prazeres da água fria e salgada.
Ele era bonito, tenho de o dizer. Tinha uma cara agradável, os olhos grandes que primeiro me tinham cativado. Uns olhos que sorriam com a boca. Ou que antes tinham sorrido com a boca. Naquela praia eram apenas grande e com círculos negros em redor. É verdade.
Mas continuava bonito e o seu corpo bem feito. E na praia usava sempre uns calções de banho vermelhos e justos, o que - em conjunto com a sua pele morena - criava um verdadeiro regalo para a vista naquele areal. O quadro era de uma beleza bastante sensual.
Eu ficava a observá-lo enquanto ele se afastava para ir até ao mar, o conteúdo tonificado dos calções de banho caminhando em toda a sua perfeição. Eu queria reter aquela imagem, se possível pará-la para meu deleite pessoal. Se possível, com o ruído das ondinhas que vinham bater contra a praia. Se possível.
Também porque aquela beleza evocava tanta coisa e também elas belas.
Depois do mar, voltava para junto de mim e aí podia vê-lo novamente caminhar, agora na minha direcção. Os calções vermelhos colados à pele morena. Acima dos calções, uma pequena seara de pêlos que ressurgia depois para cobrir levemente o peito.
Aí, eu tinha de sorrir, mesmo que não quisesse. E sorria-lhe enquanto ele se deitava ao meu lado coberto de gotas.
Eu sabia que nada daquilo era encenado. Antes fosse. Saber que tanta beleza, tanta simplicidade, tanto corpo, eram reais - naquela praia de desespero - entristecia-me. Sobretudo que eles de mim pediam apenas uma coisa.
Há muitas coisas que não sei, que nunca saberei explicar.

Quando saímos da praia, não resistia. Caminhávamos lado a lado e a minha mão estendia-se para alcançar a dele. E era assim que íamos até ao hotel, ao nosso quartinho. Juntos.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Hotel na areia 2

Quase todos os dias, descíamos à praia e, na maioria das vezes, eu não saía da toalha. Todo aquele cinzento arrepiava-me. Mas ele não. Ia sempre até ao mar, parecia ser o momento em que vivia de novo e em pleno. Andava por lá feito cão, todo contente, e o meu pesar não desaparecia.
Aquela visão feliz fazia-me sorrir e eu tentava, juro que tentava, repescar uma ligação entre aquele sorriso e um sorriso antigo, um sorriso que também fora produto meu. O aperto no peito que aquele feliz momento canino me provocava.

Na verdade, não parecia que houvesse algo mais para sentir do que apertos no peito. Como aquele da chegada, mas mesmo esse fora diferente. Estando o hotel praticamente vago, fora fácil conseguir um quarto virado para a frente, para a baía - os nossos dias passavam-se irremediavelmente nessa terrível baía, dentro dela, olhando para ela, tudo nela.
O quarto não era muito grande, mas tinha a sua graça. A mobília vinha claramente do passado e de todos os objectos e tecidos se desprendiam o odor da humidade. Aproximei-me da janela e olhei para o exterior através dos vidros marcados pelo sal marítimo; por trás de mim, ouvi-o a mexer em malas, a abrir gavetas e armários, numa fúria arrumadora. Não me sentia capaz de o olhar e todo aquele afã começava a causar-me uma pequena raiva. Sentia-me prisioneiro e a minha raiva parecia querer forçar umas lágrimas. Antes que isso acontecesse, abandonei o quarto sem dizer nada. Sem sequer o olhar nos olhos.

Não, o aperto à beira-mar era diferente. Perante aquela alegria marinha, eu sorria triste.