quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Chá com Joaninha

Do que eu preciso é que me cantes uma canção. Não uma qualquer, mas uma em particular.
Era nisso que eu pensava quando Joaninha Apolónia decidiu interromper a solidão dos meus dias e entrar pelo quarto adentro. Conseguiu mesmo, ainda não sei bem como, enfiar uma mesinha redonda junto à janela. Uma mesa sobre a qual estava disposta uma comprida toalha branca e um serviço de chá. Não a consegui demover de mudar as cortinas para outras, de um branco vaporoso. A claridade do quarto tornou-se irreal, parecia que estávamos à beira-mar.
Sugeri que mais valia colocar a mesa na varanda, do outro lado do vidro. Não era tão mais agradável?
- Ele que te leve lá para fora. - Foi esta a sua resposta.
Percebi então que havia ali um meio-termo, um ponto de moderação que Joaninha Apolónia não ousava ultrapassar. Porque não lhe competia. E Joaninha Apolónia era uma autoridade nestas coisas, fora colega e confidente de Margarida Cavaleiro. Enfim, sabia do que falava.
Por isso sentámo-nos, tomámos chá e conversámos (mais ela do que eu), sob aquela irreal luz esbranquiçada.
Depois de ter saído ("tem paciência"), só as migalhas sobre a toalha e o fundo das chávenas amarelado. E aí - o quarto ainda cheirando aos vapores do chá - decidi que era inútil lutar contra a decisão já tomada. A de esperar por ti, para que me cantasses a canção, me levasses lá para fora.

Sem comentários: