terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Vivetta procura Federico e procura-se a si mesma

- Federico, lembras-te?
- Não.
- Lembras-te? Sim.

Há muito coisa aqui que me inquieta. Sei que a minha coexistência com tanto lugar, tanta pessoa, tanta história não é pacífica. Inquieta-me sobretudo não saber se alguma vez o chegará a ser. É verdade: coexisto, mas coexisto mal. Defeito meu, estou em crer.
Refugio-me por isso na tranquilidade do que é palpável. Falam-me de sentimentos e penso no valor, na qualidade desses sentimentos. Consigo tocar num sentimento? Será prova bastante um frémito num corpo que sente? Poderá um corpo que freme tranquilizar-me?
Dizia eu que procuro o palpável nesse meu combate por uma existência pacífica, pelo menos não tão atreita a questionamentos.
(A propósito, quero recuperar Diocleciano. Recupero-o porque também ele se apaixonou. Recupero-o porque preciso dele. Preciso que não morra no fim de um dia de praia. Preciso que me responda a umas quantas questões. Que me ajude.
Se amou por amar e se bastava saber-se correspondido para que não se questionasse mais. Se ao saber-se amado, assumia esse lugar com a destreza de um herdeiro legítimo e a voracidade de um usurpador que nada teme. Para ele um corpo fremente era só mais um elemento no curso natural do que era para ele o amor.
Por isso, preciso que ele fale comigo. Que não morra e que fale comigo.)
Nada mais palpável do que uma tarde de Inverno soalheira. O vento fresco. O sol que timidamente aquece o que alcança. Os pedaços de relva tão verde. Chovera durante a noite e a tarde era de um sol - a relva não poderia ser mais verde. O cheiro dessa relva. Tudo tão real e verdadeiro. Tão concreto e, por conseguinte, confortável.
Perto de mim, caminha um homem. E também não muito longe, há um cão que corre. (Curioso como nunca em fantasia alguma minha houve um cão, um gato, um estúpido canário que fosse - no entanto, ele ali está.) O homem está ali, à distância de um braço, concretíssimo. Sinto até o seu perfume, forte e concreto. Se fechar os olhos, ouço o rumor do vento nos ramos despidos das árvores, o ruído regular de algum automóvel que passe, o cão que corre.
(Diocleciano, fala comigo, vem em meu auxílio.) Sei que tento através dessas impressões consagrar algo. Um lugar, uma pessoa, uma história. Estes.

Sem comentários: