segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Catarina 3

Catarina olhando a ria, não sabe o que pensar, não sabe o que quer.
Saber talvez até saiba (que aquele dia que ela sabe que vai chegar, chegue o quanto antes), mas por enquanto ainda não lhe é permitido (não é capaz) de formular tal desejo, muito menos de forma consciente e articulada.
Catarina olhando a ria, àquela hora o sol poente desfazendo o céu em mil tonalidades. A brisa do fim da tarde que se levanta. E Catarina sem saber. (Quantos fins de tarde não tinham eles partilhado por ali? Quantas vezes palavras bonitas não lhe tinham chegado aos ouvidos ali perto, talvez ali mesmo, à beira-ria?)
Catarina não se perdoa ter imaginado. Catarina não se perdoa ter-se rendido.
Tanto tempo, tantas horas, que Catarina dedicou a pensar nele, a projectar, a imaginar. Tantas. Primeiro, tomara sozinha uma decisão: iria com ele. As coisas não se poderiam passar de outra forma. Ele pediria que ela fosse. Ou diria que ficava. Apenas uma dessas hipóteses seria concretizável. Por isso, Catarina pensava, projectava, imaginava. Se tantos fins de tarde eles passavam à beira-ria, se tanta brisa vespertina lhe sacudira os cabelos, ameaçando os penteados.
Tola.
Antes que lhe pudesse dizer o que fosse, o mandato do pai dele como governador civil terminara e ele apenas dissera "Desculpa, tenho de ir.", acrescentando mais qualquer coisa sobre como gostava tanto dela. Assim. E metera-se num comboio e nunca mais dele Catarina soube algo.
Olhando a ria, àquela hora insuportavelmente mal-cheirosa, Catarina tem náuseas e vontade de vomitar.

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