A noite do baile de máscaras. Como parecia longínqua a Carolina alguns anos depois. Essa noite em que a sua vida mudara, por obra da aparição de Pedro, então um jovem e atrapalhado médico. Tudo parecendo tão perfeito, ela cheia de espírito e ele vítima pouco sapiente do encantamento.
Poderia dizer-se dela que seria um pouco inconstante. Alguns consideravam isso um mal do tempo. Contudo, em boa verdade, sei apenas de uma outra paixão precedente que ocupou o coração de Carolina - Pedro, um outro Pedro.
E todos no círculo viram a substituição de um Pedro por outro com muito bons olhos. Isto porque o primeiro dos Pedros não era, realmente, merecedor do afecto de Carolina. Também essa história merecerá o seu lugar, mas não aqui, não quando a entrada de um Pedro conseguiu apagar o outro de forma tão bonita, tão romântica. Não logo, é certo. Pedro bem foi dar com Carolina chorosa naquela espécie de jardim de Inverno que havia no primeiro andar da casa de seus pais, local onde ela o recebia e onde, em frente às vidraças dando para a magnólia florida do jardim, ele a cortejou e lhe soube ganhar o coração.
Carolina teria então pouco mais do que vinte anos. Durante a guerra, secundara activamente a mãe em várias obras de beneficência a favor de mutilados, órfãos e viúvas. Também por essa altura, adolescente, fizera parte da legião de admiradoras de Sidónio Pais e respectivo bigodinho.
Já não era essa rapariguinha que agora saltitava entre a Versailles e a Bénard. Voltam a mim as mesmas inquietações quando penso nesses pequenos-almoços tardios na Versailles com as amigas. As gargalhadas de Carolina. Carolina que sorria, orgulhosa, quando as amigas abriam as revistas com críticas muito elogiosas às peças do irmão. Carolina dando ares de muito avisada, mas perdendo o pé ao apaixonar-se. Não surpreende que Pedro tenha ficado fascinado naquela noite de festa em casa da viscondessa de Lima Campos.
Não foi só Pedro que mudou, Carolina também terá mudado. Mas por que não poderiam ter permanecido felizes? Sinto alguma pena por isso. Casados em 1926, tudo parecia promissor. Alguns anos depois, no entanto, tinham-se afastado. Terá o facto de não terem tido filhos contribuído por isso? Pedro foi-se tornando seco e, sobretudo, foi ganhando um amor por si próprio que irreversivelmente o afastou da candura que o caracterizava quando era um médico recém-formado com consultório acabado de montar no Chiado. Foi ganhando nome e dinheiro, tinha aquela lindíssima mulher.
Essa, admiro-a pela sensatez com que apreendeu a degradação do casamento e como, com essa constatação que outras aterraria de morte, soube o que fazer. Permanece a questão do divórcio, mas a dada altura também esse se tornou demasiado complicado de concretizar.
E o que foi feito de Tomás? De Rita, de Miguel? Qual o seu propósito nisto tudo? Todos vivendo desafogadamente na Lisboa do pós-guerra, parece-me que as suas existências se limitavam às suas paixões e desamores. Viviam focados nisso. Não consta que em algum deles vicejassem preocupações de ordem política ou social. Chega a ser confrangedor. Sabe-se que Rita com alegria casara e se mudara para o Porto, que ela achava ser um lugar melhor para ter crianças.
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