domingo, 25 de abril de 2010

O baile do governador V

Ó menina... não sei se lhe chame ingénua, se engraçada. Foi uma história bem triste essa a da Rosinha, mas não pense que foi por isso que a Beatriz lha contou.
Foi uma noite bonitinha apesar de tudo, teve o seu brilho. Mesmo não passando de um baile de província. Nem o Carlos Bento, o presidente da associação de lojistas, o primeiro a criticar o evento, faltou. Ah sim, que nunca vira coisa mais desapropriada, a de um baile dado pelo governador civil em demonstração de apoio da região ao governo, um desrespeito pelos valores, isso tudo. Pois também ele lá estava, com a sua melhor casaca, desfeito em amabilidades para com a mulher do governador. Todos iguais...
A sua mordaz amiga não poderia ter mais razão nas suas divagações em torno do jovem tenente e dos seus aposentos virados a poente. Sim, uma beleza, um deus - atrevo-me a dizer. E aquele olhar... Tão cheio de algo que nem consigo explicar. Nem eu que já vi tantos lugares e tantos homens diferentes por esse mundo... Digo-lhe, poucos terei visto que igualassem esse oficial em aparência, simpatia e timbre de voz. (Ouvi voz bem preciosa a um cónego em Luanda... Que voz... Que homem... Mas era padre.)
Mas a verdade é que a Beatriz é uma desalmada, não pára quieta. Não foi este o primeiro. Andou aí perdida de amores pelo último governador da monarquia. E sendo mulher do presidente da câmara e tudo, que bonito fica.
Não, não vou voltar agora ao cónego de Luanda, não vem ao caso... Essa desalmada é que é perigosa. Sua ingénua... Então não percebeu em tudo o que ela lhe contou sobre o tenente Zeferino Serrano - descrições muito pormenorizadas pelo que vejo - que estava apaixonadíssima por ele? Odiava a filha do Dr. Gonçalves de morte, claro. Tanto que ficou feliz por ele ser chamado a combater.

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