sexta-feira, 20 de novembro de 2009

O quarto branco

O quarto era branco e bonito de tão simples, nem sei como o deixavam assim para um convidado. O cheiro adocicado e áspero da colcha enchia a divisão. A janelinha dava para o alpendre e via-se lá em baixo o rectângulo faiscante da piscina. Em volta só a terra e as árvores.
Tinha sido naquele quarto que uma das mulheres da família trouxera ao mundo uma das outras, algumas décadas antes. Será que o aroma que a recém-nascida sentiu era já aquele misto de madeira e sabão?
Da janela alguém gritou para avisar Branca que andava pela horta, décadas antes de existir naquele local a piscina. Branca era a criadita que um dia morreria de amor por um rapaz de quinta não muito distante. Por razões um tanto ou quanto obscuras um dia fizera-se ao caminho para ser encontrada morta na planície, que nem Mireille. Uma história fascinante e sórdida o suficiente.
E o local que a criada pisara tinha agora uma piscina azul.
Mas no dia do nascimento a rapariga não sabia ainda que estava para ser uma versão alentejana da provençal. A mim deliciava-me o cheiro do quarto.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Lisboa-Cascais

Apetece-me fazer outra coisa.


"Fior di giagiolo..."
(Lola na ópera Cavalleria Rusticana)

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Pequeno apontamento

O jardim. Tão quente naquela noite de Estio. (Em toda a cidade um calor terrível se desprendia do chão e das paredes.) Havia uma melodia que saía pelas janelas iluminadas.
E ela andava por ali, pelo jardim de vegetação densa. Poderia dizer-se que os arbustos e as árvores descansavam do verde diurno, como alguém mais tarde escreveu.
Mas ela. Abrindo-se às plantas do jardim, depois da amiga que a acompanhava ter ido para dentro. Se fosse soprano em palco, seria um lamento sublime aquele que sairia das suas cordas vocais. Oh, tão sublime.
Cantado sobre um fandango espanhol em surdina que alguém tocava naquele momento ao piano.